MULHERES 50+ ASSUMEM PROTAGONISMO E MOSTRAM COMO ENVELHECER PODE SER UMA CELEBRAÇÃO DA VIDA
Mudanças sociais, psicológicas e culturais foram determinantes para que essa narrativa pudesse ser redefinida e, finalmente, valorizada
O que significa chegar aos 50 anos? Em 2023, ser uma mulher 50+ foi motivo de orgulho. Elas estão reescrevendo a narrativa do envelhecimento feminino com muito mais aceitação, segurança e, o mais importante, liberdade.
A idade deixou de ser um tabu para as mulheres contemporâneas de 50 anos que estão priorizando o que realmente importa em suas vidas, ignorando a opinião alheia e abrindo caminhos para que essa fase seja ainda mais valorizada no futuro.
E não é muito difícil se deixar inspirar por elas, é só dar uma olhada nas redes sociais, na mídia ou até mesmo para o lado e perceber como ser uma mulher madura pode ser um superpoder. A atriz Viola Davis, por exemplo, por mais que tenha atuado a vida toda, somente após os 50 anos foi que ganhou reconhecimento mundial, quebrou barreiras e alcançou o tão desejado status EGOT – quando se conquista os principais troféus do showbiz: Emmy, Grammy, Oscar e Tony.
Recentemente, a apresentadora Angélica contou que completar 50 anos a tornou mais forte e com sede por algo a mais. Isso sem contar a atriz Claudia Raia que deu à luz Luca, o terceiro filho, aos 55 anos, durante a menopausa e classifica esse período dos 50 como o mais brilhante da sua vida, onde se colhe o que plantou.
Donna conversou com especialistas da saúde física e mental para entender esse reconhecimento feminino dos 50+, e também com três mulheres que estão na plenitude de cinco décadas de vida.
Transformações
Não faz muito tempo que alcançar os 50 anos ainda era considerado, por muitos, o fim da linha na vida ativa de uma mulher, mas mudanças biológicas, psicológicas e socioculturais estão moldando essa transformação.
Tem um movimento muito legal de mulheres que começaram a se impor e a reivindicar os seus espaços
De acordo com Irani Argimon, psicóloga e professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUCRS, a expectativa de vida da mulher aumentou. Hoje, ela pode contar com suportes tecnológicos na área da saúde, doméstica e alimentícia, desafiando a ideia de que o desenvolvimento humano estagnava nessa faixa etária, podendo explorar outras opções de interesse pessoal ou profissional.
— Muitas resistências foram encontradas pelo caminho. Foi um rompimento de uma cultura machista que, embora ainda exista, hoje já é diferente. Por exemplo, as mulheres estão tendo filhos mais tarde, ensinando eles a serem independentes cada vez mais cedo, estão trabalhando naquilo que sonharam, trilhando caminhos diferentes. Foi um trabalho árduo até aqui e são conquistas importantes — enfatiza a psicóloga.
A ginecologista Joele Lerípio destaca que as mulheres perceberam o envelhecimento como uma oportunidade para priorizar suas decisões e aproveitar o tempo para desfrutar do que construíram ao longo da vida. Buscam melhorar a qualidade do envelhecimento com tratamentos preventivos para que possam viajar, praticar esportes e manter uma vida sexual ativa:
— Elas não estão vindo mais para tratar doenças, especificamente, mas estão vindo para preservar a saúde.
Em contraste com a antiga corrida pela eterna juventude, que se percorria incansavelmente há um tempo atrás, as mulheres agora estão mais seguras em aceitar as marcas que vêm com os 50 anos. Rugas, transformações corporais e cabelos brancos são percebidos por muitas como sinal de autoconfiança.
— O cuidado continua, mas sem ser aquele ‘açougue’ para mudar o nariz, tirar as rugas, como se fosse o único caminho. Essa aceitação do tempo faz com que consigam florescer de acordo com a idade que estão vivendo — detalha Irani.
Mudando a rota
Por muito tempo, a sociedade estabeleceu padrões sobre como as mulheres 50+ deveriam se portar e o que deveriam esperar da vida. No entanto, nem todas seguiram essas expectativas e questionaram as normas de gênero e rejeitaram a ideia de que o envelhecimento é sinônimo de declínio.
Elas querem conversar com quem se identificam (...) Somos uma comunidade de fato
Como é o caso da publicitária, escritora e poetisa, Claudia Schroeder, de 50 anos, que cresceu acompanhando a liberdade que o pai usufruia em qualquer ambiente, mas não enxergava o mesmo direito aplicado às mulheres.
— Tem um movimento muito legal de mulheres que começaram a se impor e a reivindicar os seus espaços, e recusando serem rotuladas como ‘velhas’. Elas estão se cuidando, mantendo a libido, ganhando segurança e aumentando a autoconfiança. Nada se compara ao tempo. Acredito que as mulheres estão fazendo isso bem, enquanto não vejo o mesmo movimento acontecer com os homens — observa.
As mulheres 50+ também estão engajadas nas redes sociais, usando como uma ferramenta para expressar suas opiniões e construir relações autênticas. Esse movimento online foi ganhando força à medida que começaram a relatar suas experiências e se apoiarem mutuamente.
A jornalista e influenciadora Patrícia Parenza, de 53 anos, compartilha suas experiências como ‘cinquentona’, como se descreve na bio do seu perfil no Instagram, trazendo temas como autoestima, moda, menopausa, entre outros, para criar conexões reais com seu público, em sua maioria, mulheres com mais de 50 anos.
— Recebo mensagens inacreditáveis dizendo o quanto as incentivei a terem coragem de muitas vontades que estavam guardadas. Elas querem conversar com quem se identificam. Quem está comigo é porque compartilha do mesmo olhar para a vida. Somos uma comunidade de fato — diz a influenciadora.
Esse senso de pertencimento a um grupo é um dos motivos pelos quais as mulheres 50+ se sentem fortalecidas ao participarem de qualquer atividade social.
— A singularidade das mulheres faz com que elas busquem relações para se fortalecer. A importância de conversar com diferentes gerações alimenta os mais jovens pelas experiências dos mais velhos e alimenta os mais velhos a se atualizarem com os mais jovens — ressalta Irani.
A empresária da Casa de La Madre, Valéria Nieto, de 51 anos, percebeu que tinha muito mais a oferecer após começar um clube de artesanato para mulheres que buscavam aprimorar o ofício, especialmente para se reposicionar no mercado de trabalho.
Há 20 anos trabalhando com economia criativa, ela entendeu que essa iniciativa não só poderia oferecer suporte profissional, mas também emocional, proporcionando uma mentoria com acolhimento. Coincidentemente, a maioria das suas pupilas tem mais de 50 anos.
— É indescritível o prazer que esse clube me dá. Me sinto valorizada e entendo a felicidade delas. Falamos muito no valor da nossa experiência e só vamos entender se a gente mostrar e não ficar encolhida. É inflando o peito mesmo — enfatiza.
Para Valéria, estar rodeada de mulheres também a ajudou a superar dificuldades pessoais, como falar em público:
— Poder unir as pessoas e fazer algo assim tão afetivo é muito construtivo e fortalecedor. Algumas mulheres 50+ estão preocupadas em se reposicionar no mercado de trabalho, outras se sentem um pouco atropeladas pela velocidade que as coisas acontecem. A gente se fortalece juntas.
Prevenções
Apesar dos avanços na medicina, na indústria farmacêutica e na estética, as mulheres 50+ ainda precisam lidar com mudanças físicas associadas ao envelhecimento. Joele destaca a importância de estudos sobre essa fase na vida da mulher, ressaltando que iniciar tratamentos precocemente pode contribuir para um envelhecimento mais saudável, inclusive para os períodos do climatério e da menopausa.
— A saúde é um conjunto de escolhas que a gente faz em prol de um melhor funcionamento do corpo. Quanto antes a mulher começar um tratamento para o processo de climatério, melhor será do ponto de vista cardiovascular, muscular e cerebral, pois o cérebro é uma das partes mais afetadas com a menopausa — alerta a médica.
Você já viu um monte de coisas e aprende que o mais importante na vida é mais ser e viver do que mostrar e ter
Patrícia Parenza conta que chegar no climatério foi como receber um “bofetão” na cara:
— O mais difícil não foi chegar aos 50 anos, mas quando entrei no climatério, que foi com 46. Foi o primeiro marco do envelhecimento feminino. Acontece uma série de transformações emocionais e físicas. Foi um encerramento de um ciclo para uma outra fase da minha vida.
Deixando marcas
A maternidade é outra área em que essas mulheres 50+ estão deixando a sua marca, ensinando seus filhos sobre igualdade de gênero e incentivando uma nova mentalidade em relação ao mundo. Palestrante sobre temas do universo feminino presentes na sua literatura, Claudia salienta a importância de incluir os homens no debate sobre a liberdade da mulher:
— Quando conto para o meu filho de 10 anos que, antigamente, as mulheres não podiam votar, nem trabalhar fora, ele fica furioso e não consegue entender isso. Então, alguma coisa estamos fazendo para melhorar, né?
A discussão também vale quando o assunto é sexo:
— Quando comecei a escrever sobre erotismo, enxergava o quanto as pessoas são reprimidas sexualmente. Não podia falar só com as mulheres, os homens têm que entender onde estão os erros. Nós, mulheres, fomos criadas para servir o outro e não para si. Mas quando descobre que pode dar prazer para si, começa a se gostar e isso ninguém ensina para a gente.
Joele ressalta que a vida sexual da mulher 50+ pode ser muito mais libertadora por um motivo: não ter mais o risco de engravidar. No entanto, isso não tira a responsabilidade de continuar cuidando da saúde sexual.
— Muitas se queixam da baixa libido, mas uma vez que elas voltam a ter uma vida sexual, voltam bem ativas. Quem se separou, fica bem namoradeira. Pela maturidade, elas estão abertas a novas experiências e fazem coisas que nunca fizeram antes — detalha a ginecologista.
Rebeldia madura
Um elemento notável dessa fase da vida é a ativação do “botãozinho do foda-se”, que proporciona um forte senso de liberdade.
— É maravilhoso porque você já viu um monte de coisas e aprende que o mais importante na vida é mais ser e viver do que mostrar e ter. Eu imagino que depois dos 60 anos fica ainda melhor — afirma Valéria.
Essa busca pela autenticidade é um momento em que as mulheres decidem abraçar plenamente quem são, conforme fez Patrícia:
— Me tornei muito mais corajosa. Com 50 anos, vem uma fase da vida que poderia ser chamada de ‘rebeldia da maturidade’.
Essa coragem de ser dona de si é o que torna ainda mais impactante ser uma mulher 50+.
— Uma mulher livre é aquela que tem coragem de dizer não. Foram muitos anos de repressão e de silêncio, acho que chega, né? — conclui Claudia.
Fonte: GZH/Revista Donna/Lou Cardoso em 22/12/2023